sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Especiarias Brasileiras

“Para mim, escrever é sempre questionar,
não importa se estou escrevendo um romance,
um poema, um artigo.”
Lya Luft.

Os resquícios do passado servem de alicerce na construção do presente e do futuro. As marcas deixadas por nós durante séculos, vão formando nossa identidade cultural. O que vivemos hoje é reflexo de nossos antepassados, e, certamente, refletirá na vida de nossos descendentes.
Vivemos em um país de diversidades, repleto de cores, misturas e sabores. Por outro lado, existe também descaso, corrupção e violência. Opostos de uma nação que se mostra indignada e ao mesmo tempo conivente. Afinal, ficar calado diante de escândalos que surgem o tempo todo é mostrar-se indiferente com a situação.
Desde pequenos somos criados segundo padrões impostos, tanto pela família quanto pela sociedade. A triste verdade é que os padrões foram banalizados. A falta de atitude e a passividade dos pais em relação à criação de seus filhos, as pessoas públicas que não dão exemplos, a própria sociedade que é uma má influência, tudo isso são vertentes do mesmo problema: a banalização do ser humano.
Por que nos sentimos tão ameaçados diante da violência que assola, não apenas os grandes centros, como há algum tempo atrás, mas também as pequenas cidades, e no momento que batemos de frente com um escândalo no Senado, viramos o rosto, indiferentes? Por que é mais fácil falar dos usuários de drogas, quando o nosso dinheiro é utilizado, ilicitamente, por pessoas públicas, que, diga-se de passagem, nós as colocamos no poder?
Não sejamos hipócritas em dizer que a parte podre da sociedade é apenas aquela que preenche os altos cargos, o problema aponta múltiplas direções. Os traficantes, ladrões, marginais, assassinos, também fazem parte deste “seleto grupo de especiarias brasileiras”, afinal, essas coisas só acontecem com tanta frequencia aqui.
O fato é que, a problemática, como já foi dito, tem várias vertentes. Uma delas é a educação. Infelizmente o Brasil é carente nessa área, e isso influencia diretamente na formação do indivíduo, que provavelmente, no futuro vai se tornar um marginal, um traficante, e quem sabe, um assassino. Por outro lado, tem a educação de casa, que também é defasada. Os pais são muito permissivos, não dão limites aos filhos, principalmente os mais abastados. No caso das famílias pobres, a situação é mais complexa. Não ter dinheiro, nem ter o que comer, é um dos fatores que influencia a entrada no mundo do crime.
Não obstante, existem ainda, aqueles que agem desonestamente por descaso. É o caso dos políticos. Qual o motivo que eles tem para roubar? Ganham bem, tem conforto e todas as mordomias possíveis: planos de saúde, viagens, alimentação e até moradia. Claro, sem falar no caixa dois. Bem, dispensam-se comentários.
Segundo a Lei da Física: Toda ação gera uma reação. Assim é na sociedade, todos os nossos atos refletem na vida de nossos descendentes. Talvez não sejamos criminosos no sentido real da palavra; matar ou roubar. No entanto, somos cúmplices. Presenciamos a todo o momento crimes que alastram a sociedade, e nos mostramos indiferentes. Não tomar nenhuma atitude, também gera uma consequência. Por isso, é preciso adotar medidas que alterem o rumo que as coisas estão tomando.
Não é tão simples resolver as coisas, mesmo porque, não existe um início e um fim. É um ciclo vicioso, que só aumenta cada vez mais rápido. Contê-lo seria impraticável, entretanto, é possível diminuir seu ritmo. A princípio, é preciso identificar quais são os fatores que geram os problemas na sociedade.
A educação é o alicerce para o desenvolvimento moral e ético de qualquer cidadão, e infelizmente, a nossa não é das melhores. Professores mal pagos, ou ligados a interesses políticos; pais que não dão limites aos filhos; desinteresse por parte do governo, são alguns exemplos que nos mostram, claramente, porque que nossa educação é tão falha.
Existe ainda o problema do tráfico de drogas, gerando violência nas ruas, causando mortes e indignação por onde passa. Traficantes envolvidos com policiais corruptos, jovens com idade abaixo de 12 anos, passam de consumidores a contrabandistas, as guerras nos morros que trazem inúmeros feridos a hospitais cheios e sem estrutura.
Somos bombardeados a todo instante com notícias absurdas: pai estupra filha, filho mata pai, senador “subtrai” (para não dizer roubar) dinheiro do governo, assassino esquarteja vítima. A primeira reação: “Que absurdo!”. E depois? Nada. Não tomamos nenhuma atitude para impedir, ou atenuar o que está debaixo de nossos olhos. Sim, porque pode acontecer com qualquer um, ninguém está imune.
Frente ao que foi dito, faz-se uma relação de como é fácil falar e, no entanto, o “agir” fica pra mais tarde. Nesse caso, fazendo uma alusão ao início do discurso, fica claro que não adianta mostrar indignação, se nada é feito para impedir que o futuro seja escrito de forma diferente, porque, de fato, somos absolutamente responsáveis por nossos atos, e estes geram consequências.
Autoridade hoje é sinônimo de antigo, retrógrado. É deprimente ver “projetos de gente” enfrentando pais e professores, na sociedade o problema é duas vezes pior. Com tantas leis que são descumpridas e muitas vezes impraticadas, fica impossível impor limites dentro e fora de casa e da escola. Por que não alterar leis antigas e ineficazes, ou até mesmo criar novas? Ou então se for difícil fazê-lo, por que não passar a praticar as que já existem? A sociedade precisa de um limite. E isso só quem pode dar é a própria sociedade.
Punições justas, autoridades atentas, muitos crimes, pouco castigo, ou muitas vezes, castigo injusto. Pólos opostos de um problema difícil de resolver. Principalmente em um país em que tudo é considerado normal. Todos os absurdos já fazem parte da nossa rotina diária. Acordamos e dividimos o desjejum com a informação de que uma criança morreu com uma bala perdida. Almoçamos com a notícia de que traficantes realizavam negócios com policiais, para não serem presos. Vamos dormir com a cabeça leve, ao saber que nosso dinheiro está nas mãos de políticos corruptos. Somos cúmplices desses crimes, é inegável.
O que o país precisa é de pessoas que demonstrem sua indignação, não apenas com palavras, mas com atitudes. Na época da ditadura os jovens enfrentaram o governo, se imporam diante da situação monstruosa à qual foram expostos. Será que vai ser preciso uma nova era de tirania para fazer florescer dentro de nós o espírito de repulsa e revolução?
Continuaremos a viver escondidos dentro de casa, com medo de receber uma bala perdida, ou ser vítima de um seqüestro relâmpago? Filhos com medo dos pais e vice-versa? Alunos mal educados ditando as regras no lugar de seus professores? Ministros, senadores, governadores, e todos os outros cargos públicos continuarão roubando nosso dinheiro e continuarão impunes? Por enquanto sim. Coisas do Brasil.

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